O fim da estratégia estática e da execução descoordenada
Artigo redigido por Carlos Caixeta → 10/2/21
Buscando ações imediatas e eficazes para proteger seus funcionários e empresas, muitos líderes abandonaram precipitadamente seus planejamentos estratégicos, planos de ação e orçamentos da noite para o dia. Além das fragilidades na base do negócio, a pandemia revelou diretrizes, metas, execuções e orçamentos de ciclo fixo seriamente desatualizados e equivocados. Por outro lado, esse momento é também uma ótima oportunidade para transformar a agenda prioritária das organizações, adotando uma abordagem baseada em dados e informações atualizadas, melhores práticas (benchmarks), evolução das estratégias e das execuções.
Certamente, existem perigos reais em se tornar altamente reativo – e eventualmente subordinado – a eventos como a pandemia. As empresas líderes estão aperfeiçoando seus processos atuais de gestão, mas igualmente adaptando-os para se tornarem dinâmicos e responsivos à situação. Estão se esforçando para diminuir o tempo dos ciclos internos e externos, buscando análises baseadas em dados estatísticos e decisões ágeis para estar à frente dos concorrentes.
Algumas organizações já contam com agendas permanentes para a melhoria e desenvolvimento de negócios, apoiadas por previsões contínuas e alocação de recursos com base em seus diferenciais tangíveis e intangíveis. Seus líderes e equipes implementam com disciplina essas práticas, aumentando significativamente a cadência e intensidade, preservando sua integridade e resultados. Uma etapa importante foi identificar critérios de gatilho e definir ações a serem tomadas à medida que certos eventos se desenrolam e os gatilhos são atingidos. O planejamento baseado em cenários durante e pós pandemia também está ajudando essas empresas de ponta a economizar dinheiro, manter a solvência, capacitar suas equipes, definir metas e promover a relevância para os clientes.
As empresas precisam também evitar os aspectos estáticos do planejamento estratégico, planos de execução e alocação de recursos. Nesse sentido, podem tomar quatro ações imediatas para criar uma agenda proativa, preservando a credibilidade da sua gestão e tomada de decisão.
1) Redefinir as pactuações de entrega de resultados e desenvolvimento
A crise reescreveu a realidade, exigindo agendas atualizadas para a entrega de resultados de todas as áreas e o desenvolvimento futuro dos negócios. Os CEOs precisam chamar os líderes e equipes das áreas e das unidades de negócios para revisar prontamente suas agendas de resultados. Os líderes podem começar definindo como a crise afetará suas prioridades e o que precisa ser ajustado, precisam avaliar a situação atual, a situação ideal para a empresa e estabelecer planos de ação para a entrega dos novos resultados. Importante também desenvolver uma visão de futuro, prevendo como a pandemia pode alterar fundamentalmente as necessidades dos clientes e o cenário do setor. Com uma visão do mundo pós-pandêmico, pode-se fornecer orientações para criar e aperfeiçoar produtos, abordagem de vendas, posicionamento das marcas, fortalecimento da reputação, da cadeia de suprimentos, do modelo operacional, das tecnologias, das equipes e lideranças para adequarem-se à nova realidade e metas.
Uma empresa de infraestrutura de tecnologia, por exemplo, identificou sua principal prioridade a curto e longo prazo: novos negócios a partir das atuais necessidades de trabalho home office. Com o objetivo de atender às novas prioridades e apostar em uma tendência sustentada da força de trabalho móvel após o término da pandemia, a empresa inspirou sua equipe de inovação e desenvolvimento a criar rapidamente novas ofertas de serviços para o teletrabalho.
Com o objetivo de suas agendas de resultados em mente, as lideranças precisam se alinhar a um novo plano financeiro, debater sobre a realidade atual e definir uma perspectiva macroeconômica de longo prazo, como por exemplo uma recessão de 3 a 4 trimestres ou ainda mais prolongada. A empresa determinará como gerenciar e evoluir suas agendas revisadas nas próximas semanas e meses.
Como etapa final, os líderes alinharão e comunicarão sobre os seus planos para garantir, focar e coordenar as suas equipes. Agendas claras também enviam uma mensagem poderosa a outros stakeholders, incluindo a sociedade, agências reguladoras, parceiros, fornecedores, clientes e conselho de administração. Apoiam também a gestão das expectativas e ansiedades sobre como a organização está reagindo aos desafios relacionados à crise, pois na ausência dessas comunicações proativas, o stress e a “rádio peão” podem criar situações de ineficiência e pânico.
2) Acelerar as comunicações e a tomada de decisões
Em momentos onde as situações podem mudar diariamente, as lideranças devem aumentar o ritmo e agilidade para responder a problemas imediatamente, forçando a periodicidade das reuniões de mensal para semanal, ou mesmo de semanal para diária. Por meio de videochamadas frequentes e reuniões mais curtas, é preciso simplificar a comunicação interna e reduzir os pesados padrões de tomada de decisão. Por exemplo, alguns bancos agora começam o dia com reuniões curtas e os executivos em pé, quando a equipe principal aborda os novos problemas e soluções que envolvem a continuidade dos negócios, a perspectiva dos clientes e a segurança dos colaboradores.
Nessa trajetória, os processos precisam permanecer robustos e relevantes, para evitar retrocessos e amadorismos típicos dos momentos de crise, onde as pessoas geralmente contornam e minam criticamente os processos para conseguir o que querem. A manutenção da integridade dos principais processos de gerenciamento sinaliza que, embora as decisões sejam mais rápidas e urgentes, as regras do jogo continuam fortes e confiáveis.
Por meio das respostas à crise, será estabelecida uma cultura de teste e aprendizado, proposição e implementação ágil de ações, descoberta de desafios ou sucessos inesperados e ajustes para encontrar as soluções certas.
3) Esclarecer gatilhos em cenários e previsões
Muitos governos ao redor do mundo estão tentando criar vários cenários pós-bloqueio e os gatilhos que sinalizarão esses cenários, e as empresas precisam fazer o mesmo. Ao redefinir as prioridades das agendas de resultados e desenvolvimentos, os líderes podem determinar gatilhos para eventos futuros, fazendo perguntas como: “O que nos levaria a retomar o projeto de expansão XYZ?”
Ao descrever e vincular esses gatilhos aos cenários, a empresa pode alcançar uma previsão clara e compartilhada de casos base. Mais importante ainda, terá uma maneira simplificada de se antecipar aos eventos e agir, à medida que eles se desenrolam.
Para suas agendas de desenvolvimento, por exemplo, muitas empresas de software em nuvem estão identificando oportunidades de fusão ou aquisição que podem acelerar o crescimento em novos mercados. Estabelecem métricas claras dos valores, avaliações e prazos de financiamento de capital de risco como gatilhos para determinar quando determinadas empresas podem estar mais abertas à parceria ou aquisição.
4) Concentrar a organização na relevância para o cliente
Em uma crise, uma preocupação imediata para a maioria das empresas é a falta de dinheiro, mas o desafio mais significativo, durante e pós crise, é a falta de relevância para os clientes. A cada ação, as empresas demonstram se são essenciais ou dispensáveis e os clientes reforçam ou enfraquecem a confiança e disposição em comprar, sendo assim as lideranças devem colocar a relevância atual e futura para o cliente no centro de suas novas agendas de resultados e desenvolvimento.
A pandemia alterou rapidamente as necessidades e os comportamentos dos clientes, e o ajuste para essas mudanças é crucial para permanecer relevante, igualmente após o término da crise. Durante o surto de Ebola na África Ocidental, o uso de dinheiro via aplicativos se generalizou, preenchendo a necessidade de trocas monetárias rápidas e seguras. Mesmo após a epidemia, o “dinheiro móvel” permaneceu como transação usual, estabelecendo uma mudança duradoura no comportamento dos clientes.
Hoje estamos vendo mudanças semelhantes, com os hospitais sobrecarregados pelos casos da Covid-19, pacientes com outras doenças recorrem a clínicas especializadas e plataformas de telessaúde – e possivelmente continuarão a fazê-lo. Durante o confinamento, muitas agências bancárias contam com funcionários para apoiar a transição dos clientes para o digital, para atender às múltiplas demandas, e possivelmente no futuro manterão esse modelo e continuarão direcionando os clientes para as plataformas online. Em todos os setores, as melhores organizações já estão reorientando suas agendas de desenvolvimento para atender às novas necessidades e comportamentos dos clientes a longo prazo.
Manual para a agenda de negócios resilientes
À medida que as empresas dão vida às novas prioridades estratégicas, podem construir adaptabilidade e resiliência duradouras para o mundo novo e mais turbulento que surge da pandemia. As perguntas a seguir são um roteiro eficiente para ajudar os líderes a iniciar seu planejamento adaptativo:
a) Proteger pessoas e outros stakeholders:
- O que estamos fazendo para manter os colaboradores seguros e alinhados?
- O que estamos fazendo para ajudar nossos stakeholdersa fazer o mesmo?
b) Preservar áreas meio da empresa:
- O que estamos fazendo para adiar custos / despesas e limitar a exposição para proteger a saúde financeira da empresa?
- Quais investimentos precisamos manter, reduzir ou cancelar, diante do cenário pós pandemia? Quais precisaremos iniciar?
- O que estamos fazendo para manter a liquidez do caixa nesse período? O que precisaremos ajustar na nossa gestão do capital de giro e estoques?
c) Acelerar partes essenciais do negócio e torná-las mais resilientes:
- O que estamos fazendo para atender os clientes de forma sustentável e escalável? Como lançar ou aumentar as ofertas de produtos e serviços digitais ou de autoatendimento?
- O que estamos fazendo para manter a resiliência operacional?
- Como acompanhamos o perfil e tendências dos nossos segmentos de clientes?
- O que estamos fazendo para manter ou reorientar as ações e entrega de valor para os nossos mercados?
- Como estamos capacitando nossos lideres e equipes para enfrentarem novos cenários e realidades?
d) Reposicionar as comunicações:
- Paramos todas as comunicações que parecem estar em desacordo com a crise?
- Como podemos começar a nos comunicar rapidamente de maneira assertiva com nossas equipes, lideranças, clientes, parceiros, fornecedores e outros stakeholders?
- Como podemos comunicar apropriadamente a nossa relevância para os clientes, durante e após a pandemia?
e) Aproveitar as capacidades, ativos e reputação para ser relevante durante e após a crise:
- Onde estamos bem reconhecidos e posicionados para atender às necessidades imediatas dos clientes? Como potencializar esse atendimento?
- Quem são os novos parceiros, fornecedores-chave e especialistas com potencial para nos apoiar a solucionar as necessidades e desejos dos clientes?
f) Planejar o mundo pós-pandêmico:
- O que estamos fazendo para nos preparar para uma desaceleração prolongada, de 1 a 2 anos? Temos uma visão lúcida, orientada por fatos e dados, sobre os setores onde atuamos e atuaremos? Temos ações coordenadas para acelerar a receita e reduzir os custos? Estamos buscando oportunidades na aquisição de capacidades, atualizações estratégicas e parcerias?
- Temos uma visão clara para nossa empresa e setor após a crise? Quais aspectos do nosso negócio precisamos aprimorar para vencer em nossos mercados? Avaliamos vários cenários futuros e definimos os pontos de gatilho que desencadearão as principais ações?
- O que estamos fazendo para avançar no mundo pós-pandemia, onde a resiliência, ações de cidadania e apoio à sociedade serão mais valorizadas? Estamos construindo uma cadeia de suprimentos mais resiliente? Estamos encontrando rotas mais independentes para atuamos nos nossos mercados? Estamos colocando nossos clientes e colaboradores em primeiro lugar, como base do sucesso? Estamos buscando boas relações com o setor público e influenciadores-chave?
Essas perguntas guiarão as empresas para se tornarem relevantes e atuarem com inteligência, humanidade e prosperidade em todos os seus negócios, nos curto e longo prazos.
Carlos Caixeta
Carlos Caixeta (carloscaixeta.com.br) é consultor, escritor, palestrante e professor de gestão estratégica, liderança, reputação e vendas nas melhores escolas de negócios do país. Autor de vários artigos e dos livros “DOBRE SEUS RESULTADOS: implemente estratégia, alto desempenho, liderança e decisão profissional” e “DOBRE SUAS RECEITAS: dicas poderosas de marketing, vendas, estratégia e persuasão”.
FONTE: SINDLOCMG