Montadoras ainda vendem carros perigosos na América Latina
Campanha Safer Cars For Latin America questiona se vidas na região valem menos
Enquanto a tecnologia de segurança avança nos centros globais de desenvolvimento automotivo, os consumidores da América Latina continuam rodando em carros inseguros. O alerta foi dado pela Consumers International, organização global que reúne grupos de defesa do consumidor. Ao lado de outras associações, a entidade apresentou a campanha Safer Cars for Latin America na quarta-feira, 8, que pretende pressionar governos e montadoras instaladas na região para que sejam atendidos os requisitos mínimos de segurança.
A iniciativa aponta que fabricantes de todo o mundo continuam produzindo e vendendo no continente carros reprovados em testes de segurança reconhecidos internacionalmente. A oferta destes modelos seria proibida na Europa e nos Estados Unidos, por exemplo. Diante disso, a entidade questiona se as vidas dos consumidores da América Latina são menos valiosas do que a das pessoas que vivem nestes outros países.
“Existe um padrão ambíguo inaceitável sendo aplicado. Vidas dos consumidores são colocadas em risco onde as regulamentações do governo são fracas. Fabricantes lucram com essas falhas nas regulamentações e continuam vendendo carros que não são seguros”, aponta em comunicado Amanda Long, diretora geral da Consumers International.
BRASIL E OS VEÍCULOS INSEGUROS
A entidade jogou na mesa dados alarmantes. Um deles aponta que em 2015 foram vendidos na América Latina 150 mil carros que seriam reprovados em testes de segurança, sem airbags ou outros recursos básicos de proteção aos ocupantes. O número indica que esses veículos colocam em risco 150 mil motoristas e outros milhares de passageiros.
O Brasil está longe de ser modelo de segurança veicular, mas larga na frente de alguns vizinhos latino-americanos, como o Peru, que não adotou nenhuma das sete regulamentações recomendadas pela Organização das Nações Unidas (ONU) e tem taxa elevada de 13,9 mortes no trânsito a cada 100 mil pessoas.
Pela legislação brasileira, desde 2014 airbag duplo frontal e freios ABS são obrigatórios a todos os veículos vendidos no País. Houve avanço também para tornar compulsório o controle eletrônico de estabilidade (ESC), tecnologia capaz de evitar capotamentos. O item deverá vir de série em todos os carros a partir de 2022 (leia aqui). Ainda assim, a Proteste, associação de defesa do consumidor, insiste que o disposivo tem alto potencial de salvar vidas e, portanto, precisaria ser implementado antes, em 2017.
FALTA COMPROMISSO DOS GOVERNOS E DAS MONTADORAS
As regulamentações parecem frágeis diante da capacidade das montadoras de produzirem carros com potencial para ferir seus ocupantes em caso de acidentes. Segundo a Consumers International, dos 10 carros mais vendidos no Brasil e no México, maiores mercados da América Latina, cinco têm a nota mais baixa possível de segurança. A entidade cita o exemplo da General Motors, que teria vendido na região mais de 725 mil veículos Chevrolet nota zero nos testes do Latin NCAP.
Segundo a Consumers International, pesquisa realizada com pessoas de quatro países da América Latina mostra que a população se sente desinformada sobre a segurança dos carros, sem saber o que esperar ou cobrar quando vão comprar um veículo. A entidade destaca que mais de 1,25 milhão de pessoas morrem anualmente em acidentes nas estradas em todo o mundo. Deste total, 90% acontecem em países com baixa ou média renda, com relação clara entre as regulamentações frágeis de segurança e o número alto de mortes no trânsito.
“Estamos pedindo que governos da América Latina adotem as regulamentações da ONU e que trabalhem junto às organizações de consumidores em campanhas de conscientização do público para salvar vidas. Nós também pedimos que fabricantes de carros parem de vender carros que não são comprovadamente seguros e que voluntariamente adotem as regulamentações da ONU. Eles terão que se adequar algum dia e nós vamos pressionar os governos para que introduzam as regulamentações”, destacou em comunicado Tamara Meza, da Consumers International do Chile.
RESULTADOS VERGONHOSOS EM TESTES DE IMPACTO
O alerta já vem sendo emitido há algum tempo pelo Latin NCAP, programa que avalia a segurança dos carros vendidos na América Latina e no Caribe. As baterias de testes de impacto do programa revelam falhas graves na proteção dos ocupantes de veículos que têm grande participação nos mercados da região. Entre os casos mais recentes estão o novo Peugeot 208, que passou vergonha ao receber apenas duas estrelas em segurança das cinco possíveis no programa (leia aqui ).
Outro mico aconteceu com a Renault no teste do Kwid, modelo que será produzido e vendido pela companhia no Brasil. A unidade avaliada pelo Global NCAP, comprada na Índia, não conseguiu sequer uma estrela em proteção aos ocupantes no teste. Diante do resultado, a Renault emitiu um comunicado que destacava uma série de recursos de segurança que a versão brasileira terá, como airbags laterais de série além da bolsa de ar frontal obrigatória no País (leia aqui).
A General Motors, mesmo sem nenhum destaque nos testes recentes da entidade, é tão especialista em fabricar carros potencialmente perigosos que recebeu até uma chamada do Latin NCAP. A organização cobrou da montadora mais compromisso com segurança (leia aqui).