O melhor erro do mundo
Somos dependentes demais do petróleo. E todo mundo sabe que a solução no longo prazo é o hidrogênio. Mas os governos não gostam de soluções de longo prazo. Eles gostam de soluções que possam estar prontas amanhã cedinho, pois ainda serão governo. Assim, eles entraram na onda do híbrido oferecendo descontos e outros incentivos para pessoas que compram carros como o Toyota Prius e similares. Isso me irrita muito. Não acredito que a solução para a crise energética vá ser encontrada por meio do desenvolvimento de um carro que tem um motor a gasolina normal em conjunto com um motor elétrico, alimentado por um banco de baterias extremamente pesado.
A questão simples é: a nova linha de híbridos plug-in que podem ser carregados por uma tomada na sua garagem vai jogar a demanda por energia elétrica nas alturas, o que será um problema para cidades como Londres, que já estão enfrentando falta de energia e até a ameaça de racionamento. Por isso, em vez de reclamar, vamos ver o que é a novidade mais esperada do ano e o carro mais comentado em muitos anos: o BMW i8. Vou passar alguns dados, para que você entenda por que todo mundo está balançado, mesmo que um pouquinho, com ele. Vai de 0 a 100 km/h em 4,4 segundos. Como todos os BMW de alto desempenho, ele tem velocidade máxima limitada a 250 km/h. E, graças ao seu trem de força híbrido, consegue fazer mais de 57 km/l. Você leu corretamente: 57 km com 1 litro!
Eu poderia ressaltar aqui que um carro movido a célula de hidrogênio poderia chegar a 1 600 km/h sem usar uma gota de combustível fóssil, mas não seria educado. Então vamos voltar ao i8, que tem um visual que parece saído de um filme de ficção científica, que pode acompanhar sem medo um Porsche 911 e custa para abastecer mais ou menos o mesmo que um carrinho de mão. Ele trabalha com duas fontes de energia. Impulsionando as rodas traseiras, há um motor turbo de três cilindros e 1,5 litro, que apesar do tamanho produz 234 cv. Na frente, tracionando as rodas dianteiras, há um motor elétrico que produz 25,4 mkgf de torque desde o momento em que você o liga. Então você tem um motor de bom torque para as rodas da frente e um pequeno mas valente turbinado para as de trás, o que me parece a receita de um desastre. Ou o carro vai rodopiar em círculos ou rachar ao meio. Significa, você pode imaginar, que para dirigir este carro precisaria se o irmão gêmeo de Buck Rogers. Mas não é assim.
O único requisito especial é, no caso de mulheres, no usar saia curta, porque entrar na cabine por baixo das portas tipo asa de cisne e por cima da soleira larga é uma manobra na qual pode-se perder a dignidade. Uma vez que você se ajeita atrás do volante, no entanto, tudo parece ser normal. Existe um sistema de GPS normal, controles de ar-condicionado normais e porta-copos normais. Só se você prestar bastante atenção perceberá que tudo parece um pouquinho mais leve e delgado do que em um BMW tradicional. A cabine tem um ligeiro jeito de Alfa Romeo 4C. Quase imperceptível. Mas isso é necessário, porque num automóvel com um banco de baterias devem ser feitos todos os esforços para se reduzir o peso. Até o para-brisa é fino. Daí você dá a partida e… nada acontece. Bem, luzes se acendem e o painel acorda, mas não há ruído. Ligeiramente perplexo, você coloca a alavanca de câmbio em Drive e o carro começa a andar. E é isso. Apesar da enorme complexidade do carro, você o dirige da mesma forma que qualquer outro. Essa é uma realização colossal. Ele não se assemelha a um veículo normal, no entanto. O i8 pesa cerca de 1 tonelada, mas parece mais leve do que uma pena. Fantasmagoricamente leve. O carro parece – e passei vários minutos pensando na melhor palavra para usar – magnífico. E ainda estamos na cidade, usando o motor silencioso como uma lagarta a maior parte do tempo. Só quando você precisa de um golpe de velocidade é que o motor a gasolina na traseira liga, para ajudar. E você nem percebe que isso aconteceu.
Mas, quando saí da cidade e peguei uma rodovia, movi a alavanca de câmbio para a esquerda, para colocá-lo em modo Sport, e cravei o acelerador no chão. Como ele muda! E como agarra no piso. Aquele motorzinho faz o som mais inebriante que conheço, tirando os V12 da Ferrari.
E, falando nisso, mais à frente na estrada encontrei uma Ferrari 275 GTS imaculada, e andamos lado a lado por um tempo. Minha Ferrari favorita entre todas e este arauto dos novos tempos, e fiquei pensando: “Hum… Qual eu preferiria?” Sim, este BMW é bom assim. Mas há coisas que preciso mencionar. Se você dirige no modo Comfort, o padrão, as baterias carregam bem devagar e, como resultado, se você pedir o modo de tração exclusivamente elétrica, eDrive, muitas vezes você recebe a mensagem de que não há carga suficiente. Já no modo Sport, a história é outra. Energia é mandada para as células toda vez que você levanta o pé do acelerador e sempre que freia. Porém, ao contrário do Mitsubishi híbrido que testei recentemente, você não sente isso acontecer. A frenagem parece normal, o que é brilhante. Quase tão brilhante quanto a direção, que é nervosa e volúvel, mas ainda assim a melhor direção elétrica que já encontrei.
Dito isso, depois de um teste relativamente longo, fiquei com apenas uns 16 km de autonomia em modo elétrico. A BMW diz que, se você carregar o carro em uma tomada da rede de energia elétrica, você consegue uns 40 km. Talvez consiga. Talvez não. Mas mesmo 25 km seriam bons o suficiente para o deslocamento diário da maioria das pessoas.
Então, aqui temos um automóvel que anda silenciosamente com seu motor elétrico quando você apenas quer ir para o trabalho. Mas que se torna um Porsche 911 quando você está com vontade de acelerar. Ele é um esportivo híbrido, mas diferente de outros, como o McLaren P1 e o Porsche 918 Spyder, por exemplo, ele não custa milhões.
Ele é tão fabulosamente inteligente que seria fácil deixar passar algumas coisas que em um carro normal seriam consideradas falhas graves. As janelas não descem por inteiro, por isso você não pode descansar seu braço na porta enquanto dirige, a visibilidade de 3/4 do carro para trás é perigosamente ruim e o porta-malas é ridiculamente pequeno. Também deve ser dito que os bancos traseiros são completamente inúteis e a suspensão é um pouco sacolejante. Então, como carro ele ainda precisa de um pouco de trabalho. Mas como realização? Uau!
A Toyota tinha acabado de convencer o mundo de que, se você quisesse um híbrido, devia dizer adeus ao conceito de diversão. Mas, com o i8, a BMW mostrou que não precisa ser assim. Eu ainda acredito que os híbridos são o caminho errado. Mas, com um i8, ir na direção totalmente errada é pelo menos maravilhosamente agradável.
Por Jeremy Clarkson, de Quatro Rodas.