Localiza vai de Uber
A maior empresa de aluguel de veículos do Brasil vê nos aplicativos de mobilidade um aliado para incrementar suas receitas
Na direção: o CEO, Eugênio Mattar, confere diariamente os números de motoristas do Uber que alugam carros de sua empresa (Crédito: Alexandre Mota / Nitro)
O CEO da Localiza, Eugênio Mattar, aos 64 anos, engrossou as fileiras dos que decidiram vender o carro, de acordo com a tendência de que o uso do veículo é mais importante do que a sua posse. Mas o empresário fez isso em altíssimo estilo. Dono de uma Ferrari, ele tomou a decisão após consultar seus dois filhos, de 14 anos e 16 anos. “Eles nem se importaram se eu tinha ou não uma Ferrari. As novas gerações não estão preocupadas com esse tipo de propriedade”, diz Mattar. “Levei 60 anos para realizar o sonho, mas quando percebi os custos de ter uma Ferrari parada na garagem, sem usar muito, decidi vender.”
A atitude de Mattar vai de encontro a um movimento global de preocupação com a sustentabilidade e de valorização do compartilhamento de carros. Para ele, não é só uma questão pessoal, mas sim de negócios: quanto mais gente sem carro próprio, maior é a lista de potenciais clientes para a Localiza e suas concorrentes diretas.
Mattar pode passar a impressão de ingenuidade ao prever uma possível conquista pelas locadoras de veículos desse público sem carro. Mas ele sabe do que fala. Apesar de o preço médio diário do aluguel ter caído de R$ 150 para menos de R$ 90, num período de 10 anos, o custo ainda é alto para quem precisa de um deslocamento pontual. Por esse motivo, os motoristas de Uber e de outros aplicativos de transporte são essenciais na estratégia da Localiza. “Acompanho todos os dias como vão os aluguéis por parte desses motoristas”, afirma Mattar. “Não divulgamos quanto eles representam no total dos nossos negócios, por ser um dado muito estratégico, mas estamos colados neles.” Uma estimativa do banco Santander calcula que os motoristas de Uber já representem 5% do volume de aluguéis da Localiza. “Estamos percebendo que o aluguel de carros e o transporte com aplicativos são complementares”, diz Paulo Miguel Júnior, presidente da Abla, a associação das empresas de locação. “Com a crise, mais gente buscou ganhar dinheiro dirigindo. Mas é importante ressaltar que, com a retomada da economia, o número de motoristas talvez caia.”
Líder do setor, a Localiza detém 33% de participação do mercado e uma frota de 190 mil carros. Entre janeiro e setembro de 2017, o faturamento atingiu R$ 4,25 bilhões, um crescimento de cerca de 36% sobre o mesmo período do ano anterior. Para 2018, a expectativa é de um aumento de receita na casa dos 20%. Mas a empresa de Mattar não está sozinha desbravando esse novo filão. As concorrentes, como a Movida, com 75 mil automóveis, e a empresa resultante da fusão entre Locamerica e Unidas, que terá 100 mil carros, estão se movimentando no mercado. Para atrair os motoristas de aplicativos, por exemplo, a Movida dá um desconto de até 50% no preço de locação, nos aluguéis mensais, para quem prova utilizar o carro para trabalho. “Por causa das mudanças de hábito das pessoas e da agilidade de entrega e de devolução dos carros, o setor tem crescido bem acima da economia”, diz Fábio Costa, diretor de relações institucionais da Movida. O ritmo de expansão do mercado tem ficado na casa dos 10% ao ano. Em 2016, o último dado disponível , o segmento movimentou R$ 12 bilhões.
Apesar do avanço do aluguel para esse público, não será fácil convencer os motoristas de que essa modalidade é vantajosa. Em páginas nas redes sociais com membros da comunidade de motoristas do Uber, o consenso é de que utilizar um carro próprio traz uma margem de lucro maior. As empresas de locação contestam e dizem que dirigir um carro de terceiros tem melhor custo-benefício. Afinal, o motorista paga apenas o valor do aluguel e do combustível e não precisa se preocupar com impostos, como o IPVA, gastos com manutenção e limpeza, depreciação e seguro. Há, também, a possibilidade de troca do veículo, por desejo ou acidente.
“Com o aumento do preço dos combustíveis, a conta não fecha”, diz Luis Ferreira, vice-presidente da Abmap, a associação dos motoristas autônomos por aplicativos. Ele diz que o valor cobrado costuma ser de R$ 1.450 por mês, para uso do carro por 6 mil quilômetros. Em combustível, por exemplo, gasta-se, pelo menos, R$ 2.200. “Para ter uma margem de lucro, o motorista precisa trafegar acima de 7,5 mil quilômetros por mês”, afirma Ferreira.
Pelos cálculos da associação, seria necessário que os carros das locadoras passassem a vir com o kit gás instalado. Mas as grandes locadoras não oferecem essa opção. Por isso, muitos motoristas partem para o mercado informal, alugando carros de outras pessoas ou de taxistas.
Fonte: Isto É Dinheiro | Negócios – Por Carlos Eduardo Valim, Eugênio Mattar –