Pesquisa aponta os principais sonhos de consumo dos brasileiros
A promotora de vendas Bruna Camila Andrade, de 23 anos, está de férias do serviço, mas optou por sacrificar o período de descanso e ganhar um extra vendendo brincos e outros acessórios na região hospitalar de Belo Horizonte: “Quero juntar dinheiro para comprar a casa própria”. Já o vendedor Danilo Soares, de 20, reserva parte da remuneração para andar motorizado: “Quero adquirir um carro”. Os dois ilustram bem uma pesquisa sobre o sonho de consumo dos brasileiros para 2014. Elaborado pela Boa Vista Serviços, a maior administradora do Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC) no país, o levantamento revelou que 41% dos entrevistados desejam, como Danilo, comprar um veículo. Outros 39% pensam como Bruna: querem a casa própria.
Essa é a primeira pesquisa da Boa Vista sobre o sonho de consumo do brasileiro, o que não permite uma comparação com os desejos da população em décadas anteriores, mas o levantamento ajuda tanto o governo quanto empresários a entender como o consumidor planeja gastar suas economias até dezembro. Depois de veículos (41%) e casa própria (39%), o brasileiro pretende reformar o lar (19%), comprar móveis novos (15%), TV (12%), telefone celular (9%), computador/tablet (8%), eletrodoméstico (8%), viajar (2%) e outros (9%).
A soma dos percentuais ultrapassa os 100% porque os entrevistados puderam optar por mais de uma escolha – em média, cada um marcou 1,4 sonho. O estudo mostra que a maioria das aquisições será financiada. O problema são os juros. As linhas de crédito encareceram bastante nos últimos meses, em razão de a taxa básica de juros, a Selic, que remunera os títulos do governo no mercado financeiro e serve de referência para as operações nos bancos e no comércio, ter disparado. A Selic, hoje, está em 10,75% ao ano, ante 7,25% ao ano, em março de 2013. As altas do indicador refletiram nos contratos de financiamentos. Um levantamento da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac) mostrou que a taxa média do crédito ao consumidor encerrou fevereiro com a nona alta seguida.
O juro médio para o cidadão aumentou de 5,65%, em janeiro, para 5,82% no mês passado – crescimento de 3,01%. É o maior percentual desde agosto de 2012. Quem for comprar um carro, como Danilo, precisa pesquisar bem as linhas de crédito oferecidas pelos bancos que trabalham com as concessionárias. Dos que planejam adquirir um veículo, 74% vão quitá-lo em prestações. Danilo ainda não calculou quanto oferecerá de entrada à concessionária, mas sabe que parte do salário, de R$ 1,5 mil, será reservada para o financiamento. “Quando posso, compro à vista. Mas quero um carro em torno de R$ 30 mil e não terei como pagá-lo de uma vez.”
Bruna, a vendedora que planeja adquirir a casa própria, já conseguiu o seu veículo. “Financiei uma moto no ano passado. Dei R$ 3 mil de entrada e pago 48 prestações de duzentos e poucos reais.” Agora ela sonha fazer o mesmo com um imóvel residencial. A maioria dos brasileiros que vai comprar a própria casa (73%) pensa como ela.
“Esse percentual (73%) é normal porque imóvel é um bem de valor alto. Mas o total de quem planeja comprar a casa própria à vista (27%) também é um número importante. Representa mais do que um quarto das pessoas”, observou Fernando Cosenza, diretor de Marketing, Inovação e Sustentabilidade da Boa Vista Serviços. Esse último número ganha maior peso em razão de a maioria dos entrevistados pertencer às classes C (44%) e D/E (50%).
“O crédito para as classes C, D/E é uma coisa recente. Não tem mais do que 12 anos. Num primeiro momento (na década passada), esse consumidor comprou a geladeira, a máquina de lavar… De repente, ele tem acesso (ao crédito) e vai pagar um juro considerável. Hoje, o contexto é outro: ele não vai mais pagar a primeira geladeira, a primeira máquina. Ele pode esperar, pode comparar preços”, completa Cosenza.
NO BOLSO
Nem todos os consumidores, porém, comparam os preços à vista e financiado. Muita gente observa o valor das parcelas e se elas não comprometem o orçamento familiar. É o caso de 33% dos que sonham em comprar ou trocar o telefone celular. Outros 10% que desejam o mesmo aparelho observam o número de prestações. Já 37% comparam o preço à vista e o financiado, enquanto 20% observam os juros. É o caso de Danilo. Em 2013, ele comprou um smartphone: “Paguei R$ 1,2 mil à vista. Evito prestações por causa dos juros. Foi assim com o telefone. Já o carro…”
O sonho de Gilda das Dores, que ganha a vida como lavradora em Entre Rios de Minas, no Campo das Vertentes, custa bem menos. “Queria uma máquina de lavar roupas. Daí não precisaria mais lavar no tanque, com as mãos. Por enquanto, não tenho dinheiro para isso”, conta a mulher, que mora com o marido, que vive de trabalho eventuais sem vínculo empregatício, e os dois filhos. O sonho de consumo dela (eletrodomésticos) recebeu 8% das respostas. A maioria (70%) planeja quitar o bem em prestações.
Por Paulo Henrique Lobato, do Jornal Estado de Minas.