Alta do carro novo leva consumidor para o usado

Alta de preços e fim do crédito farto derrubaram em 4,5% as vendas de automóveis e comerciais leves novos no primeiro quadrimestre. No segmento de usados, o resultado é inverso, com crescimento de 5% nos negócios. Como resultado, a relação entre número de carros usados vendidos para cada novo voltou à média considerada histórica de três por um, que não era registrada desde 2007, e as lojas reclamam de falta de produtos.
Apesar da melhora nas vendas, que de janeiro a abril somam 3,049 milhões de veículos (sem caminhões e ônibus), os preços dos usados seguem em trajetória de desvalorização.
Segundo o presidente da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), Flávio Meneghetti, o preço dos carros novos teve alta de 4% a 5% neste ano, porcentuais que não foram acompanhados pelos seminovos.
Vítor Meizikas, analista de mercado da consultoria Molicar, diz que, apesar da forte concorrência, as montadoras repassaram ao consumidor parte do aumento em razão da alta do IPI em janeiro e da inclusão de airbag e freio ABS em vários carros. Já os usados não conseguiram acompanhar o movimento, ampliando assim a distância de preço para o zero-quilômetro.
Nos modelos mais caros, a depreciação é maior. Para comprar hoje um Fiat Bravo Absolute, que custa R$ 62 mil, o dono de igual versão com dois anos de uso precisa desembolsar mais R$ 15 mil. Para um Gol 1.0, a diferença é de R$ 6,7 mil (mais informações no quadro acima).
Meizikas ressalta que a desvalorização do usado se acentuou nos últimos anos em parte por causa da facilidade de se adquirir o novo e em parte pela rapidez com que os carros são atualizados. “A velocidade com que as montadoras renovam seus produtos é muito maior.”
O advogado Valdecir Furlan, de 59 anos, adquiriu um utilitário Mitsubishi Outlander 2010, com 15 mil km rodados, por R$ 75 mil. A versão zero custa quase o dobro, R$ 140 mil. “A vantagem do usado é que já teve a desvalorização inicial e muitas vezes é mais completo do que uma versão básica nova.”
Furlan pesquisou muito antes da compra, pois estava difícil encontrar o que queria. De acordo com Meneghetti, a menor oferta de usados também decorre da decisão das locadoras, tradicionais fornecedoras desses produtos, de segurar carros da frota antiga em razão de uma suposta demanda durante a Copa. “Depois elas vão desovar esses modelos.”
Munir Faraj, dono da Trans-am, loja de seminovos na zona norte de São Paulo, enfrenta dificuldades em conseguir modelos, especialmente na faixa de R$ 40 mil a R$ 70 mil. “O mercado não está bombando, mas vende bem e não tenho conseguido repor estoques, pois as concessionárias não têm produtos para repassar.”
Escassez
O diretor da revenda Chevrolet Palazzo, Wilson Goes, confirma que, em razão da queda nas vendas dos novos – que neste ano somam 1,05 milhão de unidades até abril -, o usado fica escasso, pois normalmente entra na loja como parte do pagamento do zero.
“Hoje compramos seminovos mesmo que não faça parte da negociação de um novo, o que não fazíamos há mais de três anos”, diz Goes. O estoque de usados na loja gira em torno de 20 dias, quando o normal é de 35. Já os estoques de novos dão para 40 dias de vendas, e o ideal seriam 30.
“O usado é alavanca do zero. Se o consumidor não compra o zero, não entra usado na troca”, afirma o presidente da Federação Nacional das Associações dos Revendedores de Veículos Automotores (Fenauto), Ilídio dos Santos. Para ele, o mercado de usados só não está melhor por causa da falta de crédito. “Se a restrição dos bancos é forte para o financiamento de novos, imagine para os usados.” Há três anos, 70% das vendas do segmento eram financiadas. Hoje, são 40%.
Muitos clientes dos seminovos dão um carro mais antigo na troca e pagam a diferença à vista. “Muitos também têm comprado o usado com carta de crédito do consórcio”, diz Ilídio. Ele espera crescimento de 6% a 7% para o mercado total de usados neste ano, previsão similar à da Fenabrave. Em 2013, foram vendidos 9,43 milhões de automóveis e comerciais usados. Metade dos negócios, segundo Meneghetti, é feita de consumidor para consumidor, principalmente de versões mais antigas.
Por Cleide Silva, do Estadão.

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