Pedro Serra: Como a possível fusão de Unidas e Localiza deve transformar o mercado de aluguel de carros?
Em setembro do ano passado, Unidas (RENT3) e Localiza (LCAM3), as duas maiores empresas do setor de locação de veículos no Brasil, anunciaram a fusão de seus negócios, o que resultaria na formação do maior player no segmento no país, com uma frota total de 471 mil veículos – equivalente a quase 50% do share de todo mercado – e receita líquida de mais de R$14 bi.
A criação dessa nova empresa, que teria seu capital composto por 76,85% dos atuais acionistas da Localiza e 23,15% da Unidas, ainda depende da aprovação do Cade e seria feita com conversão, para os acionistas da Unidas, das suas ações na proporção de 0,446.
Do ponto de vista operacional, o negócio é, sem dúvida, transformacional para ambas. A nova empresa passaria a deter uma parcela relevante da demanda total de veículos no Brasil, o que ampliaria o seu já forte poder de negociação com fornecedores, de modo a reduzir a depreciação de sua frota.
Além disso, a companhia contaria com a expertise da gestão da Unidas na operação GTF (Gestão de Terceirização de Frotas), líder no segmento, explorando novos e promissores nichos neste segmento, como o Agro e o de Veículos Especiais.
No segmento RAC (Rent a Car), a nova empresa reinaria absoluta com dois terços do share deste mercado.
Resposta dos concorrentes
Ainda que o negócio seja, em um primeiro momento, muito positivo, há de se levar em conta o alto grau de concentração de mercado que a fusão implicaria. Combinadas, as duas empresas correspondem a 50% do total de frotas total do país.
No mercado de Aluguel de Carros (RAC), a concentração chega a 66%. Os riscos sobre a competitividade do mercado de locação são evidentes e, por esse motivo, Movida (MOVI3) e três outras locadoras contestaram a negociação frente ao Cade.
Apesar das contestações não afetarem diretamente o poder decisório do órgão, a pressão das concorrentes tem um efeito negativo sobre a conclusão da fusão, uma vez que os argumentos levantados a respeito do excesso de concentração de mercado no segmento RAC são legítimos.
Se analisarmos o histórico de decisões do Cade, percebemos que já foram vetadas operações similares, como a compra da Estácio, atual Yduqs (YDUQ3), pela então Kroton. Por outro lado, fusões de grandes empresas de um mesmo segmento também já foram aprovadas, caso de Suzano (SUZB3) e Fibria, por exemplo.
Fato é que o setor de locação no Brasil continua bastante sub penetrado e ainda fragmentado, ou seja, ainda possui capacidade de expansão.
Em países onde esse mercado é mais desenvolvido, nota-se a tendência de consolidação do segmento com poucos players.
Vale destacar também que, fora a economia de escala e a intensidade de capital, este setor não possui muitas barreiras de entrada, e a dinâmica vista no preço de diárias em RAC nos últimos anos nos mostra que o cliente tem se beneficiado tanto de preços mais baixos como de uma maior gama de produtos e serviços.
A decisão final
Uma série de fatores são levados em consideração pelo Cade na hora de avaliar esse tipo de processo, além da quantidade de competidores existentes no mercado.
Muito provavelmente, ainda que aprovada, a fusão deve passar por algum tipo de forte intervenção por parte do órgão regulador, em especial, na operação de aluguel de veículos.
Nesse sentido, o mercado já especulou uma porção de possíveis medidas, que abrangem desde a venda de lojas em certas regiões à abertura de slots em aeroporto, passando por intervenções mais duras como a venda de toda operação Rent-a-Car da Unidas.
Os reflexos na bolsa também serão sentidos. De maneira geral, o mercado vê com bons olhos o surgimento de um líder no setor, que poderia gerar muitas sinergias.
Entretanto, os investidores estão cautelosos devido à alta sofrida pelos papeis da Unidas e Localiza e os riscos implicados pelos vetos ou medidas de contenção aplicadas pelo CADE.
O investidor deve ficar de olho pois os detalhes de uma eventual intervenção afetarão diretamente no valuation da nova empresa e, caso não aprovado, deveremos ver muita volatilidade para ambas as empresas.
A decisão final deve sair em 7 a 10 meses. Em meio a tantas incertezas e expectativas, os investidores devem ser cuidadosos e acompanhar de perto os desdobramentos dessa história, que não somente impactará diretamente a bolsa, mas também os consumidores finais de um mercado em expansão no nosso país.
Por Pedro Serra
Fonte: MONEYTIMES