Vendas diretas já ultrapassam 40% do mercado total de veículos no Brasil
Grandes clientes, como locadoras, compram carros direto das montadoras com descontos generosos, o que abriu uma discussão sobre o modelo de negócios do setor
Um projeto de lei em discussão na Câmara dos Deputados, que questiona a venda direta de veículos, provocou recentemente mais discussão em torno de uma antiga e polêmica batalha que envolve indústria, concessionários e locadoras. Mas que, indiretamente, também afeta o consumidor. De qualquer forma, o embate coloca em xeque antigas regras de comércio de veículos.
Os deputados analisam a possibilidade de transformar em lei uma autorregulamentação, firmada há quatro anos pelas associações que representam as montadoras (Anfavea), os concessionários (Fenabrave) e as locadoras (Abla).
O acordo estabelece a obrigação de a locadora recolher ICMS sobre a venda do usado caso isso ocorra em menos de 12 meses. Depois disso, o veículo torna-se ativo da locadora e fica, portanto, livre da carga tributária.
Concessionárias
Além dessa questão, os concessionários se queixam do que chamam de “política comercial diferenciada”. As grandes locadoras compram carros com descontos entre 30% e 35%. Segundo a Fenabrave, de janeiro a setembro as vendas diretas representaram 40,8% dos licenciamentos de carros. No caso dos comerciais leves, essa modalidade de vendas alcançou 70,5%.
As montadoras não parecem dispostas a abrir mão do modelo que hoje sustenta a maior parte das vendas. Para o presidente da Anfavea, Luiz Carlos Moraes, “a exemplo de mercados mais avançados, o novo modelo de negócios no Brasil aponta para uma tendência de aumento das vendas diretas, tanto para atender frotistas, gestores de frotas e locadoras como para empresas que representam as novas opções de mobilidade pay-per-use [que paga pelo uso]”.
O comentário do dirigente chama a atenção para a necessidade de repensar o modelo de comércio de carros novos. O aumento da demanda do transporte por aplicativos, como Uber, indica mudança de hábitos. Recentemente, a Toyota lançou no Brasil um serviço que permite à sua rede de concessionárias operar como locadoras.
Há quem diga, entre os revendedores, que as montadoras passaram a oferecer descontos maiores para locadoras como forma de desovar estoques que cresceram em consequência da redução da exportação para a Argentina, que enfrenta uma crise profunda.
Venda de carros usados
E como fica o consumidor? Em conversa informal, um concessionário saiu em sua defesa. Segundo seu raciocínio, o cliente que compra um carro novo perde muito se decidir vendê-lo depois de um ano porque os preços de mercado desse seminovo são puxados para baixo pelas locadoras.
Qualquer pessoa sabe que um automóvel zero quilômetro perde valor assim que sai da loja. No mercado, calcula-se uma queda de pelo menos 20% no primeiro ano de uso. Mas, como as locadoras compram com até 35% de abatimento, conseguem vender os seminovos a preços mais baixos do que seria a depreciação natural.
O cenário macroeconômico tende a continuar a favorecer as vendas de veículos no varejo em 2020, segundo os fabricantes, que apontam fatores como inflação sob controle e tendência de queda das taxas de juros. Esse cenário, em princípio, deixaria mais confiante o consumidor que tem adiado a troca de carro.
A participação das vendas diretas, que a Fenabrave certamente continuará calculando, confirmará — ou não — essa expectativa. Seja qual for a fatia das vendas diretas e do varejo, o certo é que os fabricantes permanecerão felizes se o mercado continuar a expandir-se.
Fonte: Revista Auto Esporte
por MARLI OLMOS