Corrupto por natureza ou por fatores sociais?
Nem só de grandes escândalos na esfera política se alimenta a corrupção no Brasil. No dia a dia, pequenos “deslizes” são também cometidos por pessoas com padrões comportamentais específicos. Condutas essas que, decifradas desde a Antiguidade e separadas em nove tipos principais de personalidade, formam o eneagrama – um tipo de mapa do autoconhecimento cada vez mais utilizado por empresas e pessoas.
Perfis em que se destacam a vaidade, a inveja, a gula e a luxúria (tipos 3, 4, 5, 7 e 8) estão mais propensos a serem corruptos, aponta o analista comportamental e professor de eneagrama do Instituto Você, Getúlio Chaves. “Nada é imutável. Os nove eneatipos nos ajudam a entender movimentação da psique humana. Cada pessoa nasce com a predisposição de desenvolver uma personalidade, mas é a partir de alguma experiência traumática na primeira infância que a personalidade surge como um mecanismo de defesa da essência da pessoa, que foi por algum motivo ameaçada”, explica.
Essa máscara ou escudo protetor que chamamos de personalidade é o que muitas empresas buscam com os estudos de eneagrama, geralmente feitos em grupos, divididos em três etapas. Esses estudos costumam ser feitos em três dias com testes de perguntas e respostas.
Mecanismos. “Quando não sabemos como funcionamos e desconhecemos os mecanismos de funcionamento do outro, provavelmente temos atritos que poderiam ser evitados”, garante Chaves.
A experiência de identificar a sua real personalidade e voltar à sua essência foi para o empresário Érico Ricardo Matucuma, 42, de Lagoa da Prata, no Centro-Oeste mineiro, uma forma de encarar seus defeitos de frente. “É como se estivesse apontado o dedo para mim mesmo. Antes eu me cobrava muito, e hoje já me culpo menos. Acredito que essa mudança previne até doenças”, diz.
No trabalho. Matucuma também reconhece as melhorias nas suas relações de trabalho e familiares. Após o seu estudo pessoal, o empresário presenteou os seus mais de cem funcionários com o eneagrama.
“Mesmo sendo líder, eu tinha dificuldade em assumir a liderança. Quando conheci o meu tipo (3) e como funciono, minhas fraquezas e pontos fracos, aquela máscara que vira e mexe a gente usa, vão por água abaixo. No caso dos funcionários, aprendemos a motivá-los e até a evitar demissões, corrigindo situações de pessoas que exerciam funções em lugares errados”, afirma Érico Ricardo Matucuma.
Histórico que vem da colonização
Apesar de, aparentemente, não tolerarem a corrupção na política, muitos brasileiros admitiram cometer pequenas ilegalidades na pesquisa Índice de Percepção do Cumprimento da Lei (IPCL), feita pela Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas. Numa escala de 0 a dez – 0 representa o desrespeito completo às leis, e 10, a honestidade total – o índice de 2014 recuou para 6,8, em relação aos 7,3 registrados em 2013.
Os comportamentos abordados vão desde posturas mais “inofensivas”, como atravessar a rua fora da faixa de pedestres, até questões mais graves, como comprar produtos piratas ou subornar agentes públicos para evitar multas. O analista comportamental e professor de Eneagrama do Instituto Você, Getúlio Chaves, afirma que, no Brasil, o histórico dessas práticas vem desde a época de Portugal, que tinha como objetivo inicial explorar as riquezas naturais da colônia.
Em estudo da ONG Transparência Internacional sobre corrupção, o país está em 69° lugar em um ranking de 175 nações. O Brasil recebeu a nota 43 em uma escala que vai de 10, considerado extremamente corrupto, a 100, avaliado como muito transparente. A pesquisa foi concluída antes do auge dos escândalos da Petrobras.
Presente em várias áreas
Nem esoterismo, nem adivinhação. Usado para entender a personalidade humana, o eneagrama já foi objeto de estudos científicos em diferentes áreas. “Em 1960, um psicólogo boliviano e um psiquiatra chileno tiveram acesso ao eneagrama, juntando a ele toda a sabedoria da psicologia moderna. Daí para a frente ele tem sido usado como instrumento de autoconhecimento. Hoje ele é adotado por diversos segmentos do saber humano. Faz parte da grade curricular dos cursos de psicologia, teologia e direito”, diz Getúlio Chaves.
Por Litza Mattos, do O Tempo.