Salim Mattar fala sobre crise na Época
Salim Mattar é fundador e presidente do Conselho de Administração da locadora de carros Localiza.
Os empresários têm culpa pela crise?
“Sim. Em vez de brigar por condições estáveis que favoreçam os competidores mais eficientes, parte do empresariado agarra-se a estímulos e atua como um braço do Estado”
ÉPOCA – É possível fazer capitalismo de sucesso no Brasil longe de estímulos do governo?
Salim Mattar – Claro que sim. Mas o país é viciado em política pública. Para qualquer coisa, busca-se uma política pública, como se o Estado fosse o grande redentor. É uma opção dos governos, referendada pelas urnas. O capitalismo no Brasil não é um capitalismo pleno. O crédito brasileiro é estatizado, sobrou muito pouco para a iniciativa privada. As indústrias do governo têm quase 40% de participação no PIB. Nosso capitalismo é um pouco envergonhado. O empresariado depende tanto de Brasília… Como esse governo é mais populista, não entende tanto de macro e microeconomia, e se deixa levar pela conversa de grupos de interesse.
ÉPOCA – Medidas tópicas de estímulo, como a redução da tarifa de energia elétrica por decreto e a desoneração temporária da folha de pagamentos, a longo prazo favorecem ou desfavorecem as empresas?
Mattar – As desonerações do governo não agregaram valor. Dizem que elas estimularam a produção de carros e eletrodomésticos, mas a produção de carros deste ano será igual à de 2008. Aquilo tudo era falso, não tinha alicerce, era como areia. Descompensou o mercado. Virou moda ajudar um setor que não vai bem. Se não podemos competir em todos os setores, vamos competir onde temos capacidade. Os setores que receberam desonerações estão melhores que antes? As desonerações e os subsídios são uma agressão ao mercado. Os mais eficientes são prejudicados, e os menos eficientes acabam se saindo melhor.
ÉPOCA – Os empresários têm culpa pela crise?
Mattar – O empresário brasileiro tem sido omisso. Recentemente, foi proposto o retorno da CPMF. Quem foi contra? Onde estão as grandes entidades? Deveriam ter ido a Brasília 400, 500 empresários para dizer: “Vocês não podem fazer isso”. Chegamos ao ponto de ter no BNDES um banco que faz uma distribuição de renda reversa: ele tira da sociedade, do Tesouro, e empresta subsidiado para empresas escolhidas de grandes grupos. Olha a que ponto nós chegamos. Mas, mesmo assim, o empresariado não reclama. Está em apatia quase absoluta.
ÉPOCA – O que explica a apatia?
Mattar – Certas entidades não ousam muito ir contra o governo, por desfrutar farto financiamento. Os que se manifestam fazem isso em busca de subsídios e vantagens para segmentos específicos. O empresário brasileiro não se envolve muito em defesa da comunidade empresarial, por medo de retaliação de um governo que é vingativo e muito pouco ético. Isso talvez seja, desde o governo do PT, o maior motivo que tem inibido o empresariado a se manifestar. É medo da retaliação governamental.
ÉPOCA – As políticas setoriais do governo beneficiam mais as empresas ou o próprio governo?
Mattar – Essas empresas que se beneficiam da proximidade com o governo, como as implicadas no caso do petrolão, funcionam como um braço do Estado. O governo se serve delas para se fortalecer e se perpetuar no poder. Essas empresas são hoje uma extensão do governo.
Fonte: http://epoca.globo.com/ideias/noticia/2015/12/os-empresarios-tem-culpa-pela-crise-sim.html