Localiza surgiu da bronca de um pai
Salim Mattar, fundador da rede, queria ser pianista – mas bronca do pai o fez mudar de ideia e virar empreendedor
Quando criança, Salim Mattar encasquetou que queria estudar piano. Queria ser um pianista de sucesso e viajar o mundo. Numa reunião de família, num final de semana, ele contou isso ao seu pai. Ao invés de apoio, ele recebeu uma bronca, um sermão, um apertão no braço e um tapa. Ali mesmo, na sala de casa, ao lado dos irmãos, abandonou a ideia. Sem mágoas, ele iria fazer o que o pai pediu: se tornar um empreendedor de sucesso. Com dinheiro no bolso, ele poderia comprar discos e mais discos de pianistas, além da melhor vitrola para tocar as bolachas.
Mineiro de Oliveira, pequena cidade do interior de Minas Gerais, Salim é um ótimo contador de histórias. Ele arrancou risos da plateia que compareceu ao Day1, evento da Endeavor com o Sebrae, na noite de segunda-feira, em São Paulo, para ouvir sua trajetória empreendedora à frente da Localiza, rede de locações de automóveis.
Criada em 1973, em Belo Horizonte (MG), a empresa tem hoje os seguintes números: oito mil funcionários espalhados pelo país, 125 mil carros para alugar, 565 agências de atendimento, 86 lojas de vendas de carros seminovos e R$ 5 bilhões de faturamento. Mas para chegar a esse patamar, Salim teve que seguir seus instintos e ignorar os conselhos de amigos, familiares e até conselheiros.
A Localiza, por exemplo, ninguém na família queria que ele abrisse. A razão era forte. O mundo vivia naquela época uma crise no setor de petróleo. O combustível era caríssimo e poucas pessoas tinham dinheiro para ter um carro com o tanque cheio. “Quem iria, portanto, alugar um carro para passear? O conselho dos familiares vinha em forma de pergunta”, diz Salim. “Até minha namorada da época foi contra”.
Ele ignorou todo mundo e, ao lado de um sócio, construiu a Localiza. Ao abrir as portas do negócio, ela tinha seis fuscas, todos comprados à prestação, para locação. Foi um sucesso. “Ninguém acreditava. E deu certo”, diz.
Em 1978, a Localiza, logo após passar anos de crise, deu um salto nas locações. E a capital mineira estava ficando pequena para o negócio. Ele começou a vasculhar o mercado e encontrou uma locadora para comprar em Vitória, capital do Espírito Santo. “Fui falar com o dono de um banco, que era meu amigo e me emprestava capital, ele me disse para eu cuidar do patrimônio e focar em BH. Mas o que fiz? Apostei no meu instinto. E deu certo”, diz. Em pouco tempo, além da capital capixaba, a Localiza estava em Curitiba, São Paulo, Salvador, Aracaju, São Luís do Maranhão, Recife, Campo Grande, entre outras capitais
A Localiza se firmava como uma grande empresa brasileira e Salim via espaço para crescer. Em 1984, ele pesquisou o mercado internacional e descobriu o franchising. Decidiu que aplicaria o modelo na empresa. “Nessa época, eu circulava no meio empresarial. E todo mundo do meio duvidava do modelo de franquias. Deu mais do que certo!”, diz.
Salim teve a mesma postura de ir contra a corrente em outras três ocasiões: a primeira, em 1990, quando decidiu vender os carros da Localiza que seriam trocados. “Me chamaram de louco dentro da empresa”. A segunda, em 1992, quando internacionalizou a empresa para países da América do Sul. “O Brasil estava caótico após o governo Fernando Collor. Se aqui estava ruim, imagine nos demais países do continente. Ninguém acreditou que daria certo, mas deu”. E a terceira foi em 1998, quando vendeu 33,3% da empresa para o DLJ Merchant Banking (Donaldson, Lufkin and Jenrette) por US$ 50 milhões. “Amigos diziam que eu iria pedir para ir ao banheiro para os americanos, já que eles eram donos do negócio também”, explica.
Salim rechaça a alcunha de teimoso, de fazer somente o que dá vontade. Até porque ele ouviu uma pessoa, o pai. “Eu sei que ele deu o recado de um jeito meio agressivo. Os cabelos dele, no dia que falei do piano, escorriam suor. Era nervoso. Mas funcionou e hoje a Localiza é o que é”.
Fonte: Globo.com – Pequenas Empresas & Grandes Negócios – 02.08.2016 – Por: Fabiano Candido