Prazos de entrega dos veículos e o valor das locações
Estamos passando por um momento agitado nas locadoras de veículos, com a alta da demanda por parte de pessoas que buscam opções de transporte individual ou familiar, evitando modais públicos ou compartilhados. Paralelamente, a pandemia de COVID-19 também fez crescer a compra de carros novos, seminovos ou usados, desaguando na elevação substancial dos preços dos veículos.
Hoje, as montadoras e seus fornecedores ainda estão com problemas em suas linhas de produção, devido às medidas sanitárias que tiveram de aplicar em suas plantas, sem falar na variação cambial – já que todos os veículos têm componentes importados. Com esses fatores ditando as regras do jogo, a perspectiva é que o mercado somente se normalizará ao final do primeiro semestre de 2021.
Vale lembrar que, dependendo do tempo em que a pessoa ficará com o veículo, não é conveniente compra-lo, principalmente com o mercado em alta. Ao contrário, quando o período de pandemia acabar, a tendência de desvalorização será alta, na medida em que os estoques das montadoras se normalizarão e a demanda diminuirá.
Fato é que, agora, o aumento de demanda pelos carros alugados, combinado com a queda no fornecimento de veículos, atingiu severamente as locadoras. Entre abril e maio, no auge do isolamento social, as empresas do setor se viram obrigadas a adequar seus pátios a partir da venda de ativos, projetando uma retomada mais lenta e necessitando de dinheiro imediato para “fazer caixa” e atravessar a tormenta.
A surpresa veio em outubro. Antes do que vinha sendo projetado, houve a recuperação do número de veículos que o setor tinha antes da pandemia – aproximadamente um milhão de unidades. Esse abrupto aquecimento de mercado fez com que as locadoras não escapassem dos reajustes aplicados pelas montadoras, além de terem seus descontos drasticamente reduzidos.
Há modelos que tiveram alta superior a 20% em relação às tabelas de março, impactando as tarifas de locação. É importante ressaltar que o valor do aluguel tem de ser suficiente para pagar as despesas e gerar caixa para a renovação futura da frota. O uso desvaloriza o veículo e, para que o carro possa ser trocado por um Zero km, é preciso que a locadora tenha rentabilidade durante o período de locação.
Não bastasse, ainda estamos enfrentando mais um entrave: o prazo de entrega dos carros por parte das montadoras está chegando a 150 dias. Nesse caso, o problema é que quando nós fazemos a cotação de preços para alugar veículos por assinatura ou para terceirização de frotas, temos de usar o valor do veículo no dia dessa cotação. Como o prazo de entrega das montadoras está estendido, mesmo colocando agora os pedidos, elas não têm condições de manter os preços até a entrega, já que os custos dos insumos estão sendo aceleradamente corrigidos.
Resultado: havendo reajustes nos veículos, as locadoras também ficam sem as condições para manter os preços de aluguel anteriormente ofertados. Na prática, somos obrigados a também encurtar o prazo de validade das propostas apresentadas aos nossos clientes: entre a data de entrega dos veículos até a assinatura dos contratos, se houver alteração de preço dos carros estamos fazendo a ressalva de que também precisaremos alterar as tarifas de locação.
Essas têm sido sérias consequências da pandemia de COVID-19, com demandas não suportadas pelas estruturas desmoronadas por restrições e por aumento de impostos para locadoras no estado de São Paulo. Há reflexos diretos na indústria e nos serviços, que geram mais incertezas na indústria automotiva, nas locadoras e também em nossa cada vez mais significativa carteira de clientes.
PAULO MIGUEL JUNIOR, advogado, presidente da ABLA – Associação Brasileira das Locadoras de Automóveis e Diretor da CNT – Confederação Nacional de Transportes.