Renault usou ‘estratégias fraudulentas’ para manipular motores, diz relatório
Agência cita relatório dos serviços antifraude do governo da França, mas fabricante nega ‘trapaça’ em emissão de poluentes.
O Grupo automotivo francês Renault utilizou durante 25 anos “estratégias fraudulentas” para falsificar os testes de poluição de alguns dos seus motores, e a direção estava envolvida no esquema, afirmou a agência francesa antifraudes em um relatório ao qual a France Press (AFP) teve acesso nesta quarta-feira (25).
O próprio presidente da Renault, Carlos Ghosn, estaria envolvido neste “dieselgate” francês, segundo o relatório. “Não foi estabelecida nenhuma delegação de poder” por Ghosn neste caso, segundo a agência, que lhe atribui, portanto, a “responsabilidade” nesta suposta fraude.
A empresa desmentiu de imediato formalmente as acusações da agência antifraudes francesa, segundo afirmou à AFP o vice-presidente da companhia, Thierry Bolloré.
“A Renault não comete fraudes (…) Todos os veículos foram homologados de acordo com a regulamentação em vigor”, afirmou por telefone Bolloré, diretor delegado de concorrência da empresa.
Mais cedo nesta quarta-feira, o jornal “Libération” divulgou trechos do relatório dos serviços antifraude do governo da França.
“A Renault enganou os consumidores sobre os controles efetuados e, em particular, no controle regulamentar de homologação sobre as emissões de poluentes”, afirmou o órgão antifraude que é vinculado ao Ministério da Economia (DGCCRF, na sigla em francês) em um documento de novembro de 2016, que serviu para a abertura de uma investigação judicial em janeiro deste ano.
Em nota, a Renault diz que não é possível checar a veracidade dos trechos publicados, já que a investigação corre sob sigilo. A fabricante também reafirma que sempre cumpriu todas as regras de emissões e que nunca usou qualquer software fraudulento.
Investigação
A Justiça francesa anunciou em 13 de janeiro que três juízes instrutores realizariam investigações sobre se a Renault tinha manipulado as informações sobre a qualidade de seus motores em termos de poluição, e sobre os controles aos quais são submetidos os carros para sua homologação.
As investigações tinham como base este estudo da DGCCRF, no qual foram analisadas as grandes diferenças entre as emissões poluentes de óxido de nitrogênio (NOx) de veículos Renault nos testes de homologação e em condições reais de utilização.
No caso do Renault Captur, a diferença constatada nas partículas de NOx chegou a 377% e no do Clio IV a 305%. No Brasil o Captur não possui motor a diesel.
“Esses resultados permitem suspeitar que ocorreu a instalação de um dispositivo fraudulento que modifica especificamente a função do motor para reduzir as emissões de NOx nas condições específicas do teste de homologação, para que as emissões respeitem os limites regulamentares”, afirmaram os autores do relatório.
Para reforçar essas suspeitas, os agentes antifraude que realizaram diligências na sede da Renault nos arredores de Paris e em dois centros de pesquisa em janeiro de 2016 encontraram mensagens de e-mail que viriam a confirmá-las.
O “Libération” publicou uma dessas mensagens, de 25 de novembro de 2015, entre a diretora de assuntos jurídicos da empresa, a chefe de comunicação e o responsável de relações institucionais, na qual se concluía que o sistema de descontaminação dos motores é desativado nas estradas, mas funciona durante os testes.
Possível multa
Segundo os cálculos da DGCCRF, durante os mais de 7 anos em que esteve em andamento esse sistema de fraude, o fabricante comercializou cerca de 900 mil veículos que tinham sido homologados de forma duvidosa, o que representou um faturamento de € 16,8 bilhões.
Caso seja constatada juridicamente a infração, a companhia poderá receber uma multa equivalente a 10% de seu volume de negócios, cerca de US$ 3,5 bilhões de euros, indicou o jornal.
Repercussão do ‘dieselgate’
Desde que em setembro de 2015 explodiu o escândalo da Volkswagen por seus dispositivos de manipulação descobertos nos Estados Unidos, a Renault insistiu que respeitou as regras técnicas e jurídicas.
Poucos dias depois da explosão desse caso, o governo francês iniciou uma comissão técnica independente que trabalhou durante meses sobre uma centena de modelos de marcas comercializadas na França e concluiu que não tinha conseguido detectar sistemas de manipulação desse tipo, mas que também não podia descartar sua existência.
Os técnicos afirmaram que em alguns carros, especialmente os da Renault, a diferença de emissões entre os testes de homologação e o funcionamento em condições reais era inexplicavelmente distinto.
Fonte: G1