Crise das montadoras responde por um terço da queda do PIB deste ano
A crise no setor automotivo deve responder por um terço da retração da economia brasileira esperada para 2015. No cenário econômico complicado para este ano, analistas estimam uma retração do Produto Interno Bruto (PIB de aproximadamente 1,5%. A contribuição negativa do setor nessa conta é de 0,5%. O tombo da indústria automobilística provoca estrago na economia brasileira porque o setor responde por 10% da indústria nacional e, consequentemente, por 2,2% do PIB, segundo cálculos da Tendências Consultoria.
Para este ano, a consultoria estima uma queda de 24% no setor na produção medida pelo IBGE. “A queda está muito forte, e o peso do setor na economia é muito grande. Uma retração desse tamanho puxa a indústria para baixo e, consequentemente, o PIB”, afirma Rodrigo Baggi, analista da Tendências. 5% do PIB. A conta pode ser considerada conservadora, pois a Tendências trabalha apenas com dados da produção de veículos. Mas a cadeia produtiva engloba segmentos como autopeças, siderurgia, químico, plástico e borracha. Além disso, tem a área de serviços, como revendas e financeiras.
Somando as autopeças, a participação do setor no PIB sobe para 5%. No industrial, é de 21%. Pelas projeções da Anfavea, associação que representa as montadoras, devem ser produzidos este ano 2,585 milhões de veículos, 17,8% menos que em 2014. O volume será o mais baixo desde 2007. A diferença de um ano para outro representará R$ 13 bilhões a menos em arrecadação de impostos, informa Luiz Moan, presidente da entidade. De janeiro a maio, a queda está em 19,1% em comparação a 2014 (1,092 milhão de unidades). Em vendas, o tombo é de 21% (1,106 milhão de unidades).
O desempenho negativo arrasta os demais setores da cadeia e o efeito mais perverso é nos empregos. Na indústria de aços, que vende 22% de sua produção para as montadoras, 12 mil postos foram eliminados nos últimos 12 meses. Há também 1,4 mil trabalhadores com contratos suspensos (lay off). “A crise tem uma componente estrutural e conjuntural. O País veio de um crescimento pífio no ano passado, e projeção de uma recessão para este ano. Com isso, os setores não crescem”, diz o presidente do Instituto Aço Brasil, Marco Polo.
Fornos desligados
Com a queda das encomendas, a Usiminas, que tem um terço de sua produção voltada às montadoras, desligou dois altos-fornos em Cubatão (SP e Ipatinga (MG). A medida não era adotada desde 2009. Funcionários da área administrativa terão a jornada reduzida em um dia por semana, com corte proporcional de salários. Cálculos da PriceWaterhouseCoopers (PwC) indicam que, para cada emprego na montadora, há outros 12 gerados na cadeia automotiva. Por essa conta, o setor emprega mais de 1,5 milhão de pessoas.
Na relação inversa, as 6,3 mil vagas fechadas nas montadoras até maio teriam provocado outras 75,6 mil demissões em diversas áreas. Até abril, só as revendas de veículos cortaram 12 mil postos e as autopeças, 7,4, mil. Demissão nas férias No meio das férias, Willians Borges Corrêa, de 40 anos, foi informado por telefone que fora demitido da concessionária em que trabalhava havia quatro anos. “Saímos eu e mais uns quatro. Mas, contando os de outras unidades, foram muitos”, diz. Ele mora com os pais, aposentados, e ganhava entre R$ 4,5 mil a R$ 6 mil por mês. Pretende continuar na área, mas está desanimado. “No meu ramo, acho que o desemprego vai aumentar.”
Alternativas
A Karmann-Ghia, tradicional fabricante de autopeças em São Bernardo do Campo (SP), registra 45% de queda nas encomendas na comparação com 2014. Uma nova linha para usinagem de peças, que recebeu investimento de US$ 10 milhões no ano passado, ainda não iniciou operação. Antes, 100% da produção era voltada às montadoras. “Neste ano estamos buscando novos negócios nos setores eólico, naval e eletrônico”, diz Elvio Sacchi, gerente comercial. “Não fosse isso o buraco seria maior.” No início do ano, a Karmann-Guia demitiu 30% do seu quadro de pessoal e espera manter os 285 trabalhadores que sobraram. “Estamos buscando novos projetos para suprir a atual ociosidade, de 40%”, diz Sacchi.
A PK Cables, fabricante de chicotes elétricos, também viu as encomendas caírem 45% nos últimos 12 meses mas não encontrou alternativas. A unidade do grupo em Itajubá (MG foi fechada em maio e os 500 funcionários foram demitidos. A unidade de Curitiba (PR fechará as portas em março e 600 operários serão dispensados. A produção será concentrada na filial de Campo Alegre (SC). “Passamos por dificuldades em 2008, mas a crise atual é muito mais forte”, diz o responsável pelo setor de RH, Celso Silva. Os fabricantes de pneus venderam 20,8% a menos para montadoras nos primeiros cinco meses de 2015, segundo a Associação Nacional da Indústria de Pneus (Anip). A Pirelli tem 1,5 mil trabalhadores em lay-off e Bridgestone e Michelin tem 4,8 mil em férias coletivas.
Do Estadão Conteúdo.