Brasil começa a apostar em serviço de carro compartilhado
Rio, Curitiba e Recife têm iniciativas públicas para oferecer o modelo em que o motorista paga pelo tempo que usa o automóvel e pode devolvê-lo em pontos pré-definidos
Tendência nos Estados Unidos e na Europa, o compartilhamento de carros (car sharing) ainda engatinha no país, mas o potencial do mercado brasileiro já despertou a atenção do bilionário francês Vincent Bolloré, maior acionista da gigante de mídia Vivendi. A Bluecarsharing, empresa do Grupo Bolloré, foi um dos cinco grupos que se cadastraram junto à Prefeitura do Rio de Janeiro para desenvolver estudos de viabilidade para um modelo de concessão de serviços de car sharing na cidade. Além de iniciativas públicas no Rio, em Curitiba e no Recife, o compartilhamento virou um negócio em São Paulo, onde o serviço já está disponível.
Na capital paulista, a brasileira Zazcar opera com uma frota de aproximadamente 60 veículos, distribuídos por 45 pontos de partida (PODs, na sigla em inglês). A empresa iniciou as atividades em caráter experimental em 2009, com cerca de dez carros. O usuário se cadastra pela internet e, além de pagar pelo uso do automóvel, desembolsa uma mensalidade. Um das principais diferenças em relação a uma locadora tradicional está na cobrança por tempo de uso — no mínimo uma hora, com tarifação subsequente por frações de 15 minutos. Seguro e combustível estão incluídos na tarifa, que para um Gol — de segunda a quinta-feira — é de R$ 9,90 por hora. A chave fica dentro do veículo, que é aberto com a utilização de um cartão magnético.
“O car sharing está em franca expansão nos Estados Unidos e na Europa graças à tecnologia digital. Com aplicativos de smartphones agora é possível pesquisar um carro, reservá-lo e pegá-lo onde quer que seja”, diz Carlo Simongini, sócio-diretor da consultoria automotiva Focus2move.com. O consultor conta que, embora ninguém ainda tenha reportado lucro nesse negócio, sobram montadoras investindo diretamente em compartilhamento de carros. A lista inclui PSA Peugeot Citröen, Mercedes, Ford, BMW, Renault, Volkswagen e Fiat Chrysler. A ideia é oferecer o serviço como parte de um projeto mais amplo de mobilidade urbana integrada. E, com isso, garantir uma fatia num mercado que deverá movimentar mais de US$ 6 bilhões até 2020, em nível global.
No fim do mês passado, a americana Ford anunciou que vai oferecer um serviço público experimental de carros compartilhados em Londres, na Inglaterra. Numa primeira fase, o projeto envolveu cem motoristas cadastrados, que usaram estacionamentos próximos a estações de transporte público. Agora, numa segunda etapa, o serviço passará por uma ampliação. Serão duas mil pessoas, inscritas gratuitamente, e 50 carros espalhados por 20 localidades. A tarifação é feita por minuto de uso e inclui seguro, combustível e pedágio urbano. Metade da frota é composta por carros elétricos. O projeto é apenas um dos 25 experimentos desenvolvidos pela Ford como parte de um plano que tem a meta de criar novas soluções de mobilidade usando a tecnologia e conectividade.
“Quando o compartilhamento de carros começou, alguns anos atrás, havia várias limitações. Os veículos tinham de ser retirados em pontos dedicados exclusivamente a este fim e deviam ser entregues no mesmo local”, lembra Simongini, da Focus2move.com. Uma evolução importante no mercado de car sharing foi a entrada em cena da zipcar, em 2000. A start-up americana começou oferecendo serviços de compartilhamento de carros em universidades. Em 2011, realizou uma oferta pública inicial (IPO) — passou a fazer parte da bolsa eletrônica Nasdaq, arrecadando US$ 174 milhões na operação de abertura de capital. Foi vendida à Avis por cerca de US$ 500 milhões no ano passado, num sinal claro do interesse das locadoras de automóveispor esse mercado.
A Volkswagen lançou em 2011 seu serviço de compartilhamento — o Quicar — na cidade alemã de Hanover. Na época, foram disponibilizados 200 carros, em 50 estações, para aluguel por períodos curtos. Outros 70 automóveis foram oferecidos dentro de um programa de locação por intervalos mais longos de tempo. O tempo mínimo de aluguel na época era de 30 minutos, com a cobrança de € 6 pela meia hora inicial e mais € 0,20 por cada minuto adicional. Se o carro estiver estacionado, a tarifa cai para € 0,10 por minuto.
A aposta das montadoras locais no novo modelo de negócios explica, em grande parte, porque mais de um milhão de europeus já experimentaram o serviço. A projeção da consultoria Focus2move.com é de que, em 2020, o car sharing alcançará o patamar de dez milhões de clientes na Europa Ocidental, enquanto o total de veículos elétricos na região não deverá ultrapassar 250 mil unidades.Em Paris, já existem hoje, disponíveis para compartilhamento, cerca de dois mil carros elétricos. A mente — e o capital — por detrás da popularização do aluguel desses carros é a do bilionário Vincent Bolloré, de 63 anos.
Uma das empresas do seu grupo, a Bluecarsharing se cadastrou para atender um Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI). O PMI é a fase anterior ao lançamento do edital do projeto “Carro elétrico carioca”, que permitiria o aluguel de carros elétricos estacionados em vagas públicas distribuídas pelas ruas da cidade. Além da empresa de Bolloré, outros quatro grupos se dispuseram a elaborar o estudo de viabilidade. O vencedor — anunciado em fevereiro — foi o grupo Radar PPP, formado pela fabricante chinesa de veículos elétricos BYD, a PriceWaterhouseCoopers, Idom, Albino Advogados e Dirija Já. De acordo com a assessoria da Secretaria Especial de Concessões e Parcerias Público-Privadas, do Munícipio do Rio de Janeiro, o estudo ainda está em fase de elaboração — os vencedores têm um prazo de seis meses para concluí-lo. Se o projeto for considerado viável, será aberta uma licitação.
Capitais investem em mobilidade integrada
Lançado oficialmente em junho do ano passado, o projeto Ecoelétrico, da Prefeitura de Curitiba, pretende espalhar 600 carros elétricos compartilhados e cerca de mil vagas pela capital paranaense. O prazo para chegar a esta meta ainda não foi definido: por enquanto, apenas dez carros elétricos são usados pela administração pública e um ônibus, também movido a eletricidade, foi entregue na semana passada. “Estamos trabalhando para lançar um PMI (Procedimento de Manifestação de Interesse) no segundo semestre deste ano”, conta Ivo Reck Neto, coordenador técnico do projeto Ecoelétrico, numa referência à intenção do poder público municipal de criar um serviço de compartilhamento de carros. O projeto é desenvolvido em parceria com a geradora Itaipu Binacional, a montadora Renault e a portuguesa Ceiia, responsável pela plataforma de monitoramento e gestão do sistema, que incluirá também o compartilhamento de bicicletas (elétricas ou não) e a instalação de totens multifuncionais (com informações sobre mobilidade urbana). Na quarta fase do Ecoelétrico, prevista para 2020, todos os serviços estariam interligados via internet.
Na capital pernambucana, o projeto de sustentabilidade PortoLeve — desenvolvido dentro do parque tecnológico Porto Digital — engloba o compartilhamento de carros elétricos e bicicletas, além de um sistema de localização de vagas, entre outras iniciativas. Os três veículos que fazem parte do projeto de car sharing atendem a mais de 30 pessoas. Há três estações disponíveis — duas no bairro do Recife (garagem da Serttel e edifício Vasco Rodrigues, no cais do Apolo) e em Santo Amaro (estacionamento da Jump Brasil, aceleradora de negócios do Porto Digital). Cada estação possui duas vagas.
No caso do Porto Leve, a ideia não é oferecer o serviço em grande escala, mas está prevista a ampliação da base de usuários. Quando for aberto ao público o usuário vai poder se cadastrar no sistema pelo seu celular e fazer uma assinatura mensal de R$ 30. Cada viagem tem custo de R$ 20 por trajeto de meia hora — caso queira fazer a viagem sozinho. Se o usuário anunciar que está disposto a oferecer uma carona, o valor da viagem cai pela metade, já que o modelo foi pensado para estimular o transporte solidário a partir das caronas. A carga da bateria do automóvel, completa, permite uma autonomia de 120 quilômetros.
Fonte: Brasil Econômico